sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Estrangeiros e o Brasil: desafios do desenvolvimento e da identidade cultural





Uma das vantagens de estar fora do país é conhecer como as pessoas lá fora nos vêem – o que é para eles o “ser brasileiro”. É um despertar de conhecimento e reflexão da realidade do se pertencer a cultura brasileira, a um coração unido pela língua, passado histórico, costumes de comportamento e padrões de relacionamento. Meu intuito com este texto é descrever para minha gente como os estrangeiros nos observam, e com isto, oferecer ferramentas para um nacionalismo real e valorização pessoal.

Sou negro, nordestino, de família simples e criado por mãe solteira. Frequentei, na maior parte, colégio público e estudei Administração na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Sempre quis explorar o mundo, então realizei intercâmbio acadêmico na Alemanha por 1 ano e estudo/trabalho atualmente na França. Apesar de ser ainda jovem, já aprendi bastante sobre minha identidade cultural e pessoal com o auxílio desta experiência. Isto não me faz expert, mas contribuinte nesta promissora mudança de nosso país.

Quando cheguei à Alemanha, os estereótipos imaginados dos estrangeiros sobre nós tornaram-se evidentes. Alguns ainda pensam que brasileiros são retardatários; que temos diversos índios andando na rua e que somos um país de negros como qualquer país africano. Perguntas como: de que país da África você vem? Também foi outra constante, mas esta problemática abordarei em outra postagem.

Eles pensam que nossas mulheres não possuem valor pessoal e se oferecem gratuitamente; que vivemos um grande Carnaval durante todos os dias do ano. Eles têm o Rio de Janeiro como principal cidade brasileira, onde as indústrias e melhores praias se localizam. Não esqueçamos a idéia de que todo brasileiro é um jogador de futebol nato.

Tive um grande choque cultural[1] nos meus primeiros meses aqui porque não fui educado para defender meu país ou amá-lo, só satisfazer-me com ele. Na verdade, não os culpo por estas idéias; nós mesmos assumimos a posição de cidadãos de segunda classe e adoramos ser vistos como o país da farra. O jeito de fazer as coisas no “jeitinho” ou “quebrar-galho” também é subentendido para eles.

Apesar de o país ser culturalmente tão mal compreendido; tudo mudou quando comecei a estudar minhas disciplinas voltadas à economia internacional. Ao abrir jornais, assistir TV, freqüentar as aulas descobri o Brasil que não foi me mostrado enquanto habitava nele. Contemplei uma grande potência mundial e pela primeira vez vi que os países desenvolvidos têm muito expectativa e até receio dos países parte do BRIC[2]. Em todas as aulas na universidade foram citados números e fatos sobre nossa economia; muitas pessoas fizeram-me perguntas sobre os principais produtos exportadores do país, geografia, como construímos nossos relacionamentos familiares e como se deu nossa colonização. Esta experiência me fez buscar cada vez mais meu país e erguer minha voz mostrando as verdadeiras cores da potência mundial que nos tornamos.

O último país a entrar na Grande Recessão econômica de 2008 e o primeiro a sair dela; principal concorrente da França  para tomar a quinta posição no ranking das economias mundiais nos próximos anos; país que cresce anualmente 3 vezes mais que os Estados Unidos;  dono da maior descoberta de petróleo dos últimos 35 anos; maior produtor de ferro, carne, açúcar, tabaco; detentor de 14% da água potável do planeta e 23% da flora e fauna e “dono” do mais eficiente bicombustível do mundo.




Perspectiva sobre o Brasil no Programa 60 Minutes (um dos maiores famosos dos EUA)


Compartilhei com meus amigos estrangeiros relíquias de nossa literatura, cópias dos livros: Raízes do Brasil e O Povo Brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. E deixei claro que nem todo brasileiro gosta de Paulo Coelho. Mudei um pouco a visão sobre o cinema brasileiro, que transmite por si só uma visão limitada do nosso país. Nunca encontrei ninguém que conhecesse outro filme além da Tropa de Elite, Carandiru e Cidade de Deus. Compartilhei boa música, de clássicos da nossa MPB à Tulipa Ruiz e Móveis Coloniais de Acaju. Cozinhei pratos de nossa culinária e vi a satisfação deles ao provar nossa feijoada, farofa, açaí ou beijinho. E o mais legal é que assim fazendo tive mais orgulho de minhas origens.

Nossa identidade como povo foi marginalizada pelos interesses de nossos colonizadores, ou de nossas indústrias exportadoras. Nossos povos tribais sofreram um terrível genocídio; os escravos foram abandonados com nada para provar o seu valor; muitos de nossos brancos vieram como refugiados em momentos de guerras mundiais. Contudo, esta miscigenação que começou de forma desordenada e opressiva compõe uma das maiores fusões culturais e lingüísticas do mundo atual[3].

Impressionantemente não respondemos ao nosso passado como um fator residente de nossa personalidade ou identidade coletiva. Ingredientes da cordialidade e amizade prevalecem em nossas relações; a indisciplina contra tirania e autoritarismo pode ser observada, como também elementos de anarquia, mas ainda distante da unificação  para o exercício de um poder coletivo. Somos um povo feliz e festivo, reconhecidos instantaneamente não importa em qual lugar do mundo nos encontremos.

Devemos carregar em nosso peito o orgulho de ser parte da elite econômica mundial, e fazer disto, uma motivação para retroceder às nossas raízes e valorizar nossos elementos culturais, quebrando estereótipos que mancham muito de nossa verdade.





[1] Termo utilizado por indívidos dado sentimentos de não pertencer-se mais a um ambiente comum. Ex. Estadia em outro país.
[2] Grupo de economias em desenvolvimento composto pelo: Brasil, Rússia, Índia e China.
[3] RIBEIRO, Darcy - O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995