Uma das vantagens de estar fora do país é conhecer
como as pessoas lá fora nos vêem – o que é para eles o “ser brasileiro”. É um
despertar de conhecimento e reflexão da realidade do se pertencer a cultura
brasileira, a um coração unido pela língua, passado histórico, costumes de
comportamento e padrões de relacionamento. Meu intuito com este texto é descrever
para minha gente como os estrangeiros nos observam, e com isto, oferecer
ferramentas para um nacionalismo real e valorização pessoal.
Sou negro, nordestino, de família
simples e criado por mãe solteira. Frequentei, na maior parte, colégio público
e estudei Administração na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Sempre quis
explorar o mundo, então realizei intercâmbio acadêmico na Alemanha por 1 ano e
estudo/trabalho atualmente na França. Apesar de ser ainda jovem, já aprendi
bastante sobre minha identidade cultural e pessoal com o auxílio desta experiência.
Isto não me faz expert, mas
contribuinte nesta promissora mudança de nosso país.
Quando cheguei à Alemanha, os
estereótipos imaginados dos estrangeiros sobre nós tornaram-se evidentes.
Alguns ainda pensam que brasileiros são retardatários; que temos diversos
índios andando na rua e que somos um país de negros como qualquer país
africano. Perguntas como: de que país da África você vem? Também foi outra
constante, mas esta problemática abordarei em outra postagem.
Eles pensam que nossas mulheres não possuem
valor pessoal e se oferecem gratuitamente; que vivemos um grande Carnaval durante
todos os dias do ano. Eles têm o Rio de Janeiro como principal cidade
brasileira, onde as indústrias e melhores praias se localizam. Não esqueçamos a
idéia de que todo brasileiro é um jogador de futebol nato.
Tive um grande choque cultural[1]
nos meus primeiros meses aqui porque não fui educado para defender meu país ou
amá-lo, só satisfazer-me com ele. Na verdade, não os culpo por estas idéias;
nós mesmos assumimos a posição de cidadãos de segunda classe e adoramos ser
vistos como o país da farra. O jeito de
fazer as coisas no “jeitinho” ou “quebrar-galho” também é subentendido para
eles.
Apesar de o país ser culturalmente tão
mal compreendido; tudo mudou quando comecei a estudar minhas disciplinas voltadas
à economia internacional. Ao abrir jornais, assistir TV, freqüentar as aulas
descobri o Brasil que não foi me mostrado enquanto habitava nele. Contemplei uma
grande potência mundial e pela primeira vez vi que os países desenvolvidos têm
muito expectativa e até receio dos países parte do BRIC[2].
Em todas as aulas na universidade foram citados números e fatos sobre nossa
economia; muitas pessoas fizeram-me perguntas sobre os principais produtos
exportadores do país, geografia, como construímos nossos relacionamentos
familiares e como se deu nossa colonização. Esta experiência me fez buscar cada
vez mais meu país e erguer minha voz mostrando as verdadeiras cores da potência
mundial que nos tornamos.
O último país a entrar na Grande Recessão
econômica de 2008 e o primeiro a sair dela; principal concorrente da França para tomar a quinta posição no ranking das economias mundiais nos próximos anos;
país que cresce anualmente 3 vezes mais que os Estados Unidos; dono da maior descoberta de petróleo dos
últimos 35 anos; maior produtor de ferro, carne, açúcar, tabaco; detentor de 14%
da água potável do planeta e 23% da flora e fauna e “dono” do mais eficiente bicombustível
do mundo.
Perspectiva sobre o Brasil no Programa 60 Minutes (um dos maiores famosos dos EUA)
Compartilhei com meus amigos
estrangeiros relíquias de nossa literatura, cópias dos livros: Raízes do Brasil e O Povo Brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. E deixei claro
que nem todo brasileiro gosta de Paulo Coelho. Mudei um pouco a visão sobre o
cinema brasileiro, que transmite por si só uma visão limitada do nosso país. Nunca
encontrei ninguém que conhecesse outro filme além da Tropa de Elite, Carandiru e Cidade
de Deus. Compartilhei boa música, de clássicos da nossa MPB à Tulipa Ruiz e
Móveis Coloniais de Acaju. Cozinhei pratos de nossa culinária e vi a satisfação
deles ao provar nossa feijoada, farofa, açaí ou beijinho. E o mais legal é que
assim fazendo tive mais orgulho de minhas origens.
Nossa identidade como povo foi
marginalizada pelos interesses de nossos colonizadores, ou de nossas indústrias
exportadoras. Nossos povos tribais sofreram um terrível genocídio; os escravos
foram abandonados com nada para provar o seu valor; muitos de nossos brancos vieram
como refugiados em momentos de guerras mundiais. Contudo, esta miscigenação que
começou de forma desordenada e opressiva compõe uma das maiores fusões culturais
e lingüísticas do mundo atual[3].
Impressionantemente não respondemos
ao nosso passado como um fator residente de nossa personalidade ou identidade
coletiva. Ingredientes da cordialidade e amizade prevalecem em nossas relações;
a indisciplina contra tirania e autoritarismo pode ser observada, como também
elementos de anarquia, mas ainda distante da unificação para o exercício de um poder coletivo. Somos um povo feliz e festivo, reconhecidos
instantaneamente não importa em qual lugar do mundo nos encontremos.
Devemos carregar em nosso peito o orgulho
de ser parte da elite econômica mundial, e fazer disto, uma motivação para
retroceder às nossas raízes e valorizar nossos elementos culturais, quebrando estereótipos
que mancham muito de nossa verdade.
[1] Termo utilizado por indívidos dado sentimentos de não pertencer-se
mais a um ambiente comum. Ex. Estadia em outro país.
[2] Grupo de economias em desenvolvimento composto pelo: Brasil, Rússia,
Índia e China.
[3] RIBEIRO, Darcy - O povo brasileiro: a formação e o sentido do
Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995